Adultos mais jovens também podem desenvolver demência

Sara Winchester
Sara Winchester
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Um estudo recente feito pelo Biobanco da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) mostrou que a demência, normalmente associada aos idosos, pode ter uma incidência surpreendentemente alta entre os jovens adultos.

Segundo informações da pesquisadora Roberta Diehl divulgadas pela Agência Einstein, o estudo analisou o cérebro de 275 pessoas com menos de 65 anos e identificou a presença de demência vascular — aquela que é causada pela falta de circulação do sangue — em 10% da amostra. Felizmente, nem todos eles manifestaram sintomas da doença. O que esse grupo tinha em comum era a presença de lesões no encéfalo, às vezes de mais de um tipo.

A demência vascular acontece quando a circulação de sangue no cérebro é comprometida, seja em função de um vazamento (como no caso do acidente vascular cerebral) ou de um entupimento dos vasos sanguíneos. Privados de sangue, os neurônios começam a se degenerar e morrer e, com isso, o paciente passa a ter dificuldades de raciocínio, memória e compreensão.

A boa notícia é que, em muitos casos, há formas de minimizar a probabilidade de desenvolver a demência vascular. Assim como os demais problemas cardiovasculares, é possível preveni-la a partir de mudanças comportamentais, como adotar uma alimentação equilibrada, praticar exercícios, parar de fumar e evitar o consumo abusivo de álcool. Levar uma rotina estressante e trabalhar em excesso, com o tempo, também podem aumentar a pressão sanguínea e causar problemas de circulação. Há, ainda, estudos que indicam uma correlação entre a demência vascular e a depressão, de modo que, quanto antes o paciente depressivo consultar um psiquiatra, melhor.

Quem tem diabetes, doenças cardiovasculares ou já teve um derrame tem o dobro de probabilidade de desenvolver esse tipo de demência, e deve ir ao médico regularmente — mesmo sem sintomas — para manter esses três fatores de risco sob controle. O mesmo vale se eles fizerem parte do seu histórico familiar.

O diagnóstico precoce da demência vascular é fundamental, mas as circunstâncias atuais não ajudam. Em função da pandemia, o país retrocedeu na prevenção e tratamento das doenças cardiovasculares, que atingem cerca de 14 milhões de brasileiros. Isso aconteceu tanto pela sobrecarga do sistema de saúde como pelo receio de se infectar com o Sars-CoV-2, que levou muita gente a adiar ou cancelar exames, consultas e internações.

As consequências desse retrocesso já são perceptíveis. Uma pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) apontou que as mortes por doenças cardiovasculares cresceram em todas as seis capitais estudadas. Em Manaus, esses óbitos chegaram a aumentar 132% entre março e maio de 2020, em comparação ao ano anterior.

Para além dos problemas vasculares, também vale chamar atenção para o mal de Alzheimer, responsável pela maioria dos casos de demência precoce. Ele ocorre a partir de um acúmulo de proteínas no cérebro, que provoca lesão e morte dos neurônios nas regiões responsáveis pelo aprendizado e retenção de informações.

Enquanto nos mais velhos o primeiro sintoma de Alzheimer costuma ser a perda de memória, nos jovens ela tende a ser o último. Os adultos com menos de 65 anos têm maior propensão a desenvolver uma forma “incomum” do Alzheimer, na qual os sintomas predominantes são a atrofia cortical posterior (a dificuldade de processar informações visuais, como palavras escritas ou distâncias), a afasia logopênica (a perda progressiva da fala) e o Alzheimer comportamental, que afeta a capacidade de planejar e tomar decisões, e, frequentemente, faz com que o paciente perca as inibições e se comporte de forma inadequada.

Segundo a Alzheimer’s Society, principal organização não governamental dedicada à doença no Reino Unido, até um em cada três jovens com Alzheimer manifesta alguma dessas formas atípicas. Nos pacientes mais velhos, elas atingem apenas um em cada 20 indivíduos.

A demência precoce é uma doença séria, que modifica a maneira como o paciente se relaciona com o mundo de forma irreversível e pode reduzir — quando não arruinar — sua qualidade de vida. A prevenção, quando possível, e o diagnóstico precoce são ferramentas cruciais para garantir dignidade aos portadores desse mal. Quanto mais consciência e menos preconceito a sociedade tiver em torno do assunto, melhor.

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